Escrevo na esperança de novos tempos para São Paulo. E especialmente para diversos amigos e conhecidos que atuam diretamente na política - muito dos quais vejo em
fotos e matérias televisivas, ou então percebo suas ações nas práticas
políticas das últimas duas eleições - e que devem estar se sentido derrotados agora.
Há quase um ano atrás escrevi um
texto (clique aqui) apresentando minhas expectativas para as eleições que se
findaram hoje. Apontava para o fato de que, pela primeira vez desde a
redemocratização, teríamos a possibilidade de ter uma renovação de quadros dos
representantes dos principais políticos em disputa. Renovação esta, na maioria
dos casos, não intencional pelos dirigentes partidários, mas sim em razão do
lento e constante avanço de tempo e de gerações. Errei por um. Acreditava que o candidato seria o Henrique Meirelles. Subestimei o
conservadorismo paulista e paulistano que ensejou o medo do novo e, de maneira
aterrorizada, ensejou a viabilização do José Serra como representante das
famílias quatrocentonas de São Paulo. A ponto de o FHC, o tucano de mais alta
plumagem ainda na atualidade, reconheceu o erro das escolhas de seu partido em
SP, e por que não no Brasil como um todo (leiam aqui). Não obstante não o perdoe
por suas ações frente ao Plano Real e ao período 1993-2002 (sobre isso já
escrevi aqui no blog – cliquem aqui), FHC é ainda uma pessoa a quem admiro por
ter um pensamento profundo (mesmo discordando) sobre a realidade, sabendo
claramente suas escolhas. E mais uma vez, ao menos reconheceu em público o
equivoco de seus consortes partidários.
Claro que entendo que “o novo” na
política, ainda mais como fatos determinantes para uma escolha, é tema dos mais
insignificantes. Não se pode dizer que uma escolha é melhor ou pior só porque o
objeto da escolha é novo. Pois o reverso dessa lógica superficial também
pode ser verdadeiro. Ou como dizia Sergio Reis: Panela velha é que faz comida
boa. O que quero dizer é que um pensamento assim é de uma superficialidade
burra e ilusória.
E a escolha do Haddad para
governar São Paulo nos próximos anos é o exato oposto disto.
É triste a constatação de que a
política em São Paulo, para me restringir por aqui mesmo, esteja adstrita a
políticos limitados intelectualmente falando. Aqui me refiro aqui não a
conhecimentos técnicos cartesianos em determinadas áreas, mas ao pensamento
filosófico em si.
Mas felizmente, dentre todos os
candidatos a cadeira maior de nossa cidade, posso afirmar que, mesmo inconscientemente,
a escolha do eleitor caminhou no sentido de eleger o filósofo-rei, para me ater
a expressão cunhada por Aristóteles. Todos sabem que o Haddad é formado em
Direito, Economia e Filosofia. Porém só o título não basta (conheço muitos,
muitos titulados que tem um pensamento filosófico tão raso quanto uma criança
de 10 anos de idade). Pela análise crítica da realidade é que se alcança uma
profundidade filosófica (e não o contrário) a qual determinará sua nova ação. E este é o caso de Fernando
Haddad.
Suas ações
políticas/administrativas são pautadas numa análise critica da realidade em que
o interesse coletivo, a promoção da igualdade material entre todos os cidadãos,
é o que deve prevalecer e não o contrário. E é exatamente isso que se percebe
em todo o seu programa de governo, como também em seus pronunciamentos
públicos. E o último deles, o da vitória, é marcado por uma sensatez, humildade, ponderação, respeito com o público e, principalmente, republicano e democrático. Vale a pena conferir (clique aqui).
Unir a cidade para um projeto coletivo urgente. Que garanta a Justiça Social; a Democracia Direta e Participativa; a Sustentabilidade Sócio-Economica-Ambienta; Transparência e Controle Social. Estimulo a economia criativa. Enfim. é algo que não vimos até então quiçá nos discursos dos predecessores de Haddad.
Isso denota uma mudança de postura única. Haddad, assim como a Dilma, o
Lula e diversos políticos alinhados ao PT tem demonstrado uma postura que é
entendida como um sinal de fraqueza, quando na verdade é o extremo oposto.
Reconhecer as dificuldades, mas
se colocar verdadeira e energicamente a disposição para supera-las. Reconhecer os erros, inclusive em
casos que ultrapassam a barreira da moral e da ética do momento presente e
pedir desculpas. Articular com todos, independentemente de posturas ideológicas
diferenciadas. Isto é uma demonstração de grandeza e de um amadurecimento
político que, infelizmente, ainda não foi incorporado pela grande maioria de
nossa sociedade.
Claro que tenho críticas ao PT.
Críticas sérias. Principalmente no campo ideológico. Particularmente elas se
originam na “Carta ao Povo Brasileiro” publicada em junho de 2002, momento em
que se deu uma guinada na ideologia do PT, que rompeu com o socialismo em
direção de um Estado Intervencionista de Bem Estar Social remodelado – não em
razão dos 8 anos de FHC (que foram a maior expressão da implementação da lógica
neoliberal do Consenso de Washington), mas sim frente ao Governo de Getúlio
Vargas e João Goulart - e mais profundo. Não creio que esse seja o caminho ideal, mas dentre as possibilidades é a que se melhor coloca à disposição. Pois na ação do PT e de alguns de seus aliados, é que se verifica uma capacidade de ação direta que busca
promover, a um só tempo, a emancipação política de cada individuo e uma
distribuição mais justa dos bens materiais de nossa sociedade.
Particularmente acredito que a única solução para o fim das desigualdades sociais e para que alcancemos uma justiça social verdadeira é o socialismo. E para tanto há que haver a superação nuclear e estrutural do capitalismo burguês, que se baseia na circulação mercantil, em que o valor das coisas é estabelecido em razão do interesse de mercado, quando o ideal seria por sua utilidade frente ao interesse e, principalmente, às necessidades materiais do corpo social. Os meios de produção não devem estar a serviço do acumulo de riquezas e poder, mas sim das necessidades materiais reais de todos, indistintamente de sexo, raça e principalmente de uma meritocracia estupida, já arraigada desde os bancos escolares, que é uma das raízes das desigualdades sociais e o principal locus da reprodução social do capitalismo burguês.
E realmente gostaria que a
sociedade paulistana, paulista e brasileira, superasse a visão tacanha que tem
sobre a vida em sociedade, a vida política e institucional. Que advém de um
paternalismo que remota as origens do homem em sociedade. É cansativo ver
campanhas políticas em que os candidatos se colocam tal como o personagem “Sassa
Mutema” que brilhantemente Lima Duarte interpretou décadas atrás em “O Salvador
da Pátria”. O mundo é dialético e complexo por sua natureza. Não podemos
admitir que as soluções virão de um “pai” onipresente, que assumirá as
responsabilidades para atender as necessidades de seus filhos. O caminho é
exatamente o contrário. Somente do ativismo político participativo e direto, em
que nos empoderemos de nossa sociedade, em que as barreiras entre
Estado-Instituições-Sociedade desapareçam é que nos revelará as ações a serem
tomadas e os caminhos a serem seguidos.
Tampouco existe uma solução
racional universal única que nos levará ao paraíso em terra ou no céu. Tomas de
Aquino, Rousseau e Kant estavam equivocados em seu pensamento. Tampouco a
dialética hegeliana (de tese e antítese em que o racional é o real e o real é
racional) nos dá a solução necessária para a justiça social. Somente a partir
de um pensamento crítico sobre a
ação concreta havida na realidade do corpo social, tal como Marx e Engels propõem desde 1840, é que alcançaremos a
igualdade real e a dignidade humana plena.
Por isso, a todos aqueles que
estão com raiva nesse momento aqui vai uma recomendação: Superem a raiva,
aprofundem seu pensamento filosófico crítico, para que assim, possamos
propugnar um debate político de qualidade. Pois o que vimos tendo nos últimos anos,
principalmente com o Serra/Kassab (e aqui me refiro a sua pessoa, não a seu
partido), na boa, é enojador.
E Haddad, estamos aqui, te
apoiando e ao mesmo sendo críticos. Espero que sua primeira ação administrativa seja a
descentralização do poder municipal, com o fortalecimento das Subprefeituras e
a criação dos Conselhos de Representantes. O desafio é grande e somente com o
dialogo com todos é que poderemos superar os diversos desafios de nossa cidade.
Parafraseando Marx e Engels: “ Cidadãos
paulistanos UNI-VOS!!!”